Pular para o conteúdo principal

Susan das Cobras

    Susan das cobras era mulher e menina. Nunca meio termo. Era proibido, em sua cabeça, se comprometer no meio. Nunca mais ou menos para ela, que às vezes parecia ter oito anos de idade, noutras vezes era adulta e mulher. Seu nome era Susan, como o sussurro de uma língua bífida e obscura. Era a menina-mulher das cobras, pois as colecionava.
    Entretanto, era ela o bichinho de estimação - servia a um altar das víboras e rastejava por sua aprovação. Era uma serpentinha, um monstro esguio. Todo dia as levava para tomar sol, para passear, se alimentar. Toda noite se injetava com uma agulha mais aguçada que qualquer seringa. O antídoto e veneno eram apropriados, pois rastejaria pra qualquer das direções. 
    Certa vez Susan se deitou sobre o ventre imitando o rastejar e bifurcando a língua enquanto tateava sua vida que se tornava duas também. Susan foi perdendo os braços e as pernas enquanto arrastava na música do chocalho numa dança sinuosa. Quando seu corpo se cobriu de escamas, ficou triste, pois sua pele havia sido bonita um dia, mas não podia chorar - ela era um réptil.
    E as cobras que se disfarçavam de pessoas na troca de pele se revelaram piores que víboras.  Susan só dançava e sussurrava o presente se tornando não apenas uma serpente, mas a nova entidade no altar. Ela cravou as presas peçonhentas no novo destino e, sem mais nem menos, tornou-se elusiva e furtiva como Cleópatra, Medusa e Kali. Ficou misteriosa e cheia de violência como Ourobouros e Satanás. 
    Mas nunca deixou de progredir como Kundalini sob a proteção da árvore Boddhi.

Comentários