Caneta Hermética

Eu não sou gente. Sou o quociente e as próprias operações. Sou o expoente de ideias em carne. Não sou resoluções. Sou memes e genes organizados mudando e replicando indefinidamente. Eu sou minha mente e eu sou o resultado dos pais; do meio em que vivo; de quando a vida chega ao fim. E eu não sou crente, Mas "eu" tá muito além de "mim".

A mente é um macaco selvagem gritando. Ela taca merda de galho em galho e lá do alto despenca. Ela investe contra as cobras escondidas nos troncos. Ela rouba comida e faz guerra. Ela também grita por mentiras: Às vezes família, outras vezes justiça, muitas vezes salário. Quase sempre ela grita sobre macacos perdidos. Quando viu outra árvore saltou em sua direção Pois queria roubar um ou dois frutos do pensamento Mas quando foi pro ar, encontrou o chão Porque era nas raízes onde estavam os sentimentos

Se eu pudesse seria o traficante, o farmacêutico, o alquimista e assim te traria uma pílula para as dores do dia-a-dia. Se fosse mais concreto, deslizaria do meu sonho direto para o seu e levaria minha espada abstrata Pra livrar sua mente dos fantasmas com o fio da navalha. Se eu pudesse, seria quem pronuncia a palavra e faria uma transfusão de sangue porque o veneno que vai em mim talvez te sirva de antídoto. Se eu pudesse, seria seu casulo, só pra na hora certa ser rompido porque depois disso, você vai voar.

Eles dizem que nem tudo é preto-no-branco,  e que na vida há diversos horrores...  depois vão pra igreja rezar para os santos  e se livrar dos demônios interiores. Enquanto isso, eu sempre vi as coisas com mais cores. Dizem que nos quadrinhos o bem supera o mal e que os monstros têm que caber nos quadros do layout Mas enquanto há brigas reais,  as crianças salvaram o mundo no quintal.  Enquanto há bombas nos escondemos nos sonhos e nas nossas sombras Enquanto há cinzas Há cores a serem preenchidas  E quando há heróis, há também vilões, monstros, anti-heróis e vítimas. Enquanto isso eles se sentem altivos,  mas foram capturados pela rotina.

Solitário, andando, sentindo que não adianta. O adiantamento só antecipa a miséria e a memória de ouvir os passos  quando na verdade está sozinho.  Estava esperando pela visita ou pela visão, pelo ensinamento – preferencialmente revelação, pra que desse menos trabalho.  Mas já estava agarrado aos pensamento  ao invés de meditação. Antes mesmo das máscaras e do tablado, estava sozinho. De Malkuth a Kether, na velocidade da luz  mas desacompanhado

A vida é um caleidoscópio e estamos girando. Enquanto o jogo segue todos os cacos e espelhos refletem, e num instante coexistimos. A vida é um floco de neve e estamos caindo. Caímos um sobre o outro, enterrando e reunindo pois somos cristais da mesma substância, porém distintos. Somos todos filhas e filhos.  Quando nos encontramos no vértice de espelhos, estamos juntos e com um giro, nos despedimos. O caleidoscópio somos nós. Nós somos os cacos de vidro.