Os Nativos Pálidos

Quando os europeus chegaram à ilha não havia nenhuma pegada. Ela estava nua; habitada apenas por espaços vazios, árvores e suas sombras. Assim, a ocupação foi fácil. A resistência que os europeus enfrentaram foi apenas o tempo e os esforços exigidos para o término das construções. Fizeram casas, armazéns, igrejas. Em poucos anos as famílias se multiplicaram e dobraram a esquina das gerações.

Os anos seguiram, sendo interrompidos apenas no dia da Grande Partida. Durante um eclipse lunar todos na vila de repente perceberam que durante todos aqueles anos não estiveram sozinhos. Parados, fitando a luz evanescente da lua, as silhuetas dos antigos começaram a aparecer. Elas apareciam em ângulos ignorados e pensamentos reprimidos. Elas não surgiram – apenas se mostravam ao sair de suas tocaias ontológicas. Ao final do eclipse, os nativos olharam para os europeus e se foram.

Eles, os nativos, os furtivos, os pálidos residentes da ilha. Eles, que sempre estiveram entre os europeus, observavam tudo, a todo instante. Eles foram chamados de invisíveis, espiões, voyeurs e fantasmas. Alguns eram do tamanho de gatos, outros altos como árvores. Olhar diretamente para um deles era como ver o reflexo sobreposto de pirâmides espelhadas: nunca podiam ser compreendidos sem que o observador questionasse os próprios sentidos.

Alguns diziam que naquela noite, para vê-los, você precisaria focar a visão na lua, e aí suas silhuetas apareceriam na visão periférica. Estiveram na ilha com todas as pessoas, mas invisíveis, imóveis. Alguns estiveram de pé, observando, por décadas. Depois do eclipse eles partiram em procissão, todos eles em comunhão, e entraram num buraco sob o monólito na colina da ilha. E isso é tudo.

Eles se foram e todos sabem disso. Eles partiram, e com eles todas as preocupações que revelaram. Que ignorávamos.

Eles se foram, os invisíveis, os descortinados, os nativos.

Não há com o que se preocupar.